sexta-feira, agosto 25, 2006

São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 2006

BARBARA GANCIA

McDia Infeliz

Não seria mais coerente apoiar um movimento para esclarecer a juventude sobre os riscos da obesidade?

ALÔ, RONALD MCDONALD, o palhacinho preferido das crianças obesas! Quer dizer que amanhã tem McDia Feliz na rede de lanchonetes McDonald's?

Para quem não sabe, o McDia Feliz é aquele sábado do ano em que toda a renda obtida com a venda do sanduíche Big Mac é doada ao Graac (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer).

A campanha, de âmbito nacional, é divulgada nas escolas e conta com o trabalho dedicado de dezenas de milhares de voluntários, entre os quais constam instituições financeiras, como o Banco Real, que neste ano adquiriu 7.000 vales-Big Mac para distribuir entre seus funcionários, e grandes empresas, como a Philco, que desenvolveu uma campanha com os seus vendedores para dar vales-Big Mac de acordo com a performance de cada um.

Não é comovente ver o país inteiro se juntar em mutirão por uma boa causa? Bem, como não me incomodo em fazer o papel de estraga prazeres, respondo ao meu próprio questionamento com um sonoro NÃO.

Antes que você diga que sou do contra ou que estou pouco me lixando para as crianças e os adolescentes com câncer, gostaria de lembrá-lo, meu nobre leitor, de que a comida do McDonald's faz mal à saúde.

Comprovadamente. O documentário indicado ao Oscar, "Super Size Me - A Dieta do Palhaço", de Morgan Spurlock, está aí que não deixa mentir. Depois que o filme foi lançado nos EUA, o McDonald's se viu obrigado a tirar as gigantescas porções "super size" do cardápio.

Os funcionários do banco Real e da Philco podem fazer com seus estômagos o que bem entenderem, mas, se tenho escolhas melhores, por que eu deveria comer algo que é nocivo à saúde para ajudar crianças e adolescentes com câncer?

Aliás, porque será que o McDonald's escolheu justamente as crianças, indefesas, como o objeto de sua campanha? Não seria mais coerente apoiar um movimento para esclarecer a juventude sobre os graves riscos da obesidade?

Parece mesmo que algumas pessoas só usam a cabeça para apoiar o chapéu. Não está na cara que a qualidade da alimentação influi, e muito, na saúde e na longevidade? Pois o McDonald's fazer campanha para ajudar crianças com câncer não é mais ou menos a mesma coisa que uma Philip Morris ou uma Souza Cruz da vida promoverem campanhas para levantar fundos em prol das vítimas de câncer no esôfago e no pulmão? Não é o equivalente aos fabricantes de bebidas alcoólicas financiarem campanhas para ajudar as vítimas de acidentes de trânsito?

Apoiar qualquer ação do McDonald's significa incentivar o consumo diário de carne, hábito que está devastando o planeta, a começar pela Amazônia. É de admirar que empresas de porte não vejam nada de errado em ligar o seu nome ao de uma campanha canhestra como a do McDia Feliz. Se desejam doar dinheiro para ajudar a quem precisa, por que não o fazem diretamente, depositando o tutu na conta corrente do Gracc, da Santa Casa ou de outra entidade de escolha? Será que ninguém no banco Real ou na Philco se deu conta de que parte do dinheiro doado ao McDia Feliz vai parar, na forma de impostos, nos cofres do governo?


barbara@uol.com.br

(negritos meus.)

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