domingo, julho 24, 2005

é o fim:

A indústria descobre o retrossexual
Empresas miram um novo tipo de consumidor: o machão moderno, que gosta de roupas clássicas e escuras, anda de picape e nem quer ouvir falar de grife, design, cosméticos...

Por Christian Carvalho Cruz

Você vai ao barbeiro, jamais ao cabeleireiro. Compra suas roupas na mesma loja há anos. Não dá a mínima para grifes, nem sabe direito o que é design. Toma banho com água, sabonete (o que tiver) e xampu (se tiver). Creme hidratante? Nem pensar! Manicure? Sai fora! Calça capri? Ihhhh... Bom, talvez você seja um retrossexual. Criado na Inglaterra, o termo define um novo tipo de homem cujos padrões de consumo começam a chamar a atenção de marketeiros e publicitários. O retrossexual se opõe ao metrossexual. Este último é aquele camarada que perdeu a vergonha de ser vaidoso e tem no jogador David Beckham a sua mais completa tradução. O retrossexual está mais para Clint Eastwood em filme de Sergio Leone: ele se veste de maneira básica, é extremamente prático e racional na hora de fazer compras e de jeito nenhum encosta a barriga (ele tem barriga, sim, algum problema?!) no balcão do bar para pedir uma Smirnoff Ice. Ele vai é de uísque — duplo e sem gelo. Em suma, trata-se do velho macho. A palavra retrossexual, aliás, vem de “retrô”. Ela indica uma volta ao passado, um resgate dos valores masculinos tradicionais. No fundo, é a grande massa de consumidores homens. Só que até agora essa categoria não havia sido, digamos, catalogada. O instituto francês de pesquisas Ipsos acaba de concluir um estudo mundial sobre tendências de consumo no qual já aparece o retrossexual. “O conceito do metrossexual não foi algo natural. A indústria o empurrou de cima para baixo a fim de aumentar as vendas aos homens. O retrossexual surge como uma resposta espontânea a isso e como mais uma tentativa do homem de encontrar lugar num mundo cada vez mais feminino.” Seja como for, o que não falta é quem lucre com os verdadeiros machões.

A paulistana Camisaria Colombo lida com esse consumidor desde 1917. E sabe como poucas o que ele gosta de ter no guarda-roupa: terno preto, cinza escuro ou azul-marinho. Camisa branca ou azul (o turquesa é questionável). Acessórios? Cinto. Nas malhas de inverno há mais ousadia – elas podem ser verdes e até cor-de-vinho. E chega. “Nosso cliente é muito prático”, diz Patrícia Amaro, gerente de marketing da Colombo. “Ele entra na loja e sabe exatamente o que quer.” Ao contrário do metro, o retrossexual detesta provadores. A Colombo não “queima” coleção em liquidações. O que não vendeu neste verão vai vender no próximo, pois a roupa do retrossexual é básica, demora para sair de moda.

Há um ano, também em São Paulo, a empresária Rosalba Ortiz teve a grande idéia de montar a Azzurro, uma loja 100% retrossexual. Num sobrado de 200 metros quadrados, ela vende presentes e utensílios de homem que é homem: kit churrasco, dominó, pijamas, carteiras de couro, cachaças, conhaques, charutos e...pochettes (o retrossexual é um ser prático, ora!). “É uma maravilha trabalhar com esse público”, diz Rosalba. “Ele é decidido, não se interessa por marcas e, se acha que determinado produto vai ser útil, gasta sem dó.”

Um dos principais fornecedores da Azzurro é uma empresa retrossexual por excelência: a Victorinox, que no Brasil distribui seus famosos canivetes suíços e os isqueiros Zippo, objetos que macho nenhum pode se dar o direito de não ter. “São 267 modelos de canivetes, mas 45% se concentram no mais clássico – vermelho, 91 milímetros, 23 funções”, informa Paulo Sapienza, gerente da Victorinox no País. Ele diz que no último ano e meio conseguiu um significativo aumento de vendas a partir de duas mudanças simplórias nas lojas. Passou a exibir os canivetes abertos na vitrine e aumentou o número de modelos mostrados de três para vinte. “A única necessidade do retrossexual é saber qual modelo lhe será mais útil. Se der para descobrir isso sem pedir ajuda ao balconista, melhor”, conta Sapienza.

E o carro do retrossexual? Picapes e utilitários esportivos, é claro. De preferência aqueles anunciados em comerciais com cavalos, rios e muita lama. “São automóveis que, antes de bonitos, precisam ser funcionais”, diz Luis Salem, gerente geral de marketing da Ford. “A Ranger, por exemplo, tem um único console central, bem grande, para o motorista colocar todos os seus pertences”. Ou seja: porta-trecos espalhados por painel, portas, sob o banco é coisa de metrossexual. A Nissan foi além. Seus dois modelos produzidos no Brasil, Frontier e Xterra, têm o design (ops!, a forma) inspirado em uma luva de boxe e uma caixa de ferramentas, respectivamente.

O retrossexual também preza muito a hereditariedade de certos hábitos, costumes familiares. Por isso, ele faz a barba à moda antiga, num demorado ritual matinal, como seu pai e seu avô. Aí quem manda é a Bozzano, da Revlon. A empresa produz creme e espuma de barbear. O creme, imutável há mais de 50 anos e sem nenhuma tecnologia, representa 80% das vendas – que cresceram 24% em 2004. “Notamos que os homens valorizam cada vez mais os produtos simples”, avalia Davi Damazio, gerente da Bozzano. “O melhor é que eles são muito fiéis à marca. Dificilmente experimentam outra.” A fabricante também tem dois tipos de loção pós-barba – uma líquida, com bastante álcool, e outra em gel, sem álcool. O placar das vendas mostra 85% contra 15% a favor da com álcool. Sabe por quê? Ora, retrossexual que é retrossexual tem que sentir a pele arder, senão o produto não é eficaz. E estamos conversados.

Fonte: link

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