sábado, janeiro 15, 2005



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sábado de dormir, comer (pouco), bater papo no msn e estudar.
e ler notícias, fofocas e coisas que o google encontra sem a gente pedir.

uma coluna que li hj:



Arnaldo Bloch
Publicado em 15 de janeiro de 2005, O GLOBO

Moda: tô fora


Outro dia ouvi o Diogo dizer que não gosta de música e que futebol é irrelevante. Ao contrário dele, adoro música e acho futebol importante pra cacete. Minha implicância é com moda (não sei se o Diogo gosta, presumo que sim).
Vejam bem: sei que a moda transcende seu fim imediato, que é o tutu-making, essa atividade que move o planeta e nos leva, irremediavelmente, à Tsunami Final.
Fui à escola. Sei que moda também é cultura, forma de expressão, que acompanha as transformações sociais, que é um sistema, que é uma linguagem, blablablá, blebleblé, blibliblí, bloblobló, blublublú.
Mas não me ligo. Não adianta. Aposentei tudo que é sociaaaaalllll. Agora só penso no social mesmo, o outro lado, não só no sentido de povão, mas no sentido de aí meu irmão, no sentido de hippie-velho, hippie-velho-cansado-da-seca-hard-rock-heavy-caymmi, morou?
Camiseta tá bom. Largona. Deixar o cabelo crescer. Deixar a barba crescer. Ficar parecido com o Jamari França, isso é que é o fino. Esquecer a meia, aplicar o véio polvilho anti-séptico, calçar o sapato das grandes paradas e vamsimbora.
Aí o pessoal vai dizer: mas, Arnaldo, isso é atitude, isso é estilo, é o seu jeito de ser, então é moda. Eu digo: não! Não é moda coisa nenhuma! Não penso nela quando quero me ver assim. Atitude é o cacete. Isso é autenticidade, é metamorfose ambulante.
Então vem Ana Cristina Reis e me lembra que, lá pelo final dos anos 70, ser autêntico era um paradigma que correspondia ao que hoje se chama atitude. E que a minha atitude era retrô, e resgatava o paradigma do autêntico. E daí? Não pensei nisso. Não quero vender isso. Só se alguém pagar muito. O que eu duvido. Se o que eu disser for influenciar, nem que seja infimamente, o sistema de moda, não foi essa minha intenção, não quero saber, não quero fazer parte disso.
Todos os dias me assusto com o que as pessoas fazem em nome de sua auto e de sua out-imagem. Tenho uma amiga que era tão linda quando a gente tinha uns 20 anos... uma gata, uma ninfa. Tudo bem, tinha um narigão, mas eu ficava louco por ela do jeito que ela era, e acho que ela estava à vontade assim. Fiquei apaixonado e tudo. O nariz. Aquilo que o Toni Marques, num de seus mais geniais momentos, chamou de "detalhe redentor", algo que está fora do padrão e da moda, mas que confere sensualidade, sofreguidão. E que o Vinicius chamou de molejo de amor doído ( Uma mulher tem que ter/Qualquer coisa além de beleza/Qualquer coisa de triste/Qualquer coisa que chora/ Qualquer coisa que sente saudade/ Um molejo de amor machucado ).
Mas aí a minha amiga linda e nariguda virou madama, e começou a diminuir o nariz, sei lá, uma vez a cada dois anos, e também havia uns reflexos, inflexos, excessos e abcessos, e o resultado é que, cada vez que a encontro, não a reconheço, e o que vejo é uma caricatura ao inverso do que ela era. Saudades daquela ninfa, que desapareceu. E olha que ela ainda nem é coroa.
Vão me falar de idade? Que envelhecer é difícil? Aahahahahahahah! Deixe-me morrer de rir. A ex-nariguda em questão nem coroa é. Ainda assim, tá cheio de coroa ou pré-coroa linda e prosa por aí que não toca em nada, que deixa transparecer o que era na juventude, apesar das marcas inevitáveis do tempo.
Se algumas mulheres e alguns rapazes viciados em gel se enxergassem de fora, examinando-se nos espelhos dos elevadores, talvez se dessem conta do ridículo que passam, todos os dias, em público. É constrangedor. Se o espelho for grande, ficam umas três, quatro pessoas, se vacilar espremem até cravo. Putzgrila (isso mesmo!, putzgrila! ), elevador não é banheiro, cacilda! Eu quero é mocotó.
Vamos falar com seriedade: moda não existe. Moda é atalho, porque o que interessa mesmo é aquela hora em que, entre quatro paredes, o bicho pega. Se não pegar, não há beleza, não há tecido, não há costura, não há criador que vá dar jeito.
Fashion é ficar nu, é comer melancia nu, é comer manga nu e entrar no banho. Fashion é trepar. Fashion é deitar esparramado, a cama em desordem, os travesseiros espalhados.
Fashion é o cabelo ao natural, a cor, o pigmento, o sal da praia, a franjinha molhada depois do banho. Fashion é o cheiro do corpo, o calor da pele, o suor e o seco.
Fashion é cérebro vivo, é idéia sem venda, é feijoada no quintal, sem projeto de marketing, sem tenda, sem bolha. Fashion é o sorriso que vem sem ensaio, fashion é destruir o armário e escolher a roupa no balaio.



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