ontem fui pro sítio, voltei hj à tarde. cansada, pq já faz alguns dias que eu não durmo pelo menos 8 h. 
estudei, ouvi música, brinquei com os cachorros. 
mas, graças a deus, estou de volta à civilização.
* o filme 33, do kiko goifman, tá pronto.
* não sou mto fã do carlos drummond de andrade (só pq minha bisavó não gostava dele), mas tava vendo a reprise do saia justa e a fernanda young leu esse poema dele.
mto bonito.
Resíduo
De tudo ficou um pouco. 
Do meu medo. Do teu asco. 
Dos gritos gagos. Da rosa 
ficou um pouco. 
Ficou um pouco de luz 
captada no chapéu. 
Nos olhos do rufião 
de ternura ficou um pouco 
(muito pouco). 
Pouco ficou deste pó 
de que teu branco sapato 
se cobriu. Ficam poucas 
roupas, poucos véus rotos, 
pouco, pouco, muito pouco. 
Mas tudo fica um pouco. 
Da ponte bombardeada, 
de duas folhas de grama, 
do maço 
- vazio - de cigarros, ficou um pouco. 
Pois de tudo fica um pouco. 
Fica um pouco de teu queixo 
no queixo de tua filha. 
de teu áspero silêncio 
um pouco ficou um pouco 
nos muros zangados, 
nas folhas, mudas, que sobem. 
Ficou um pouco de tudo 
nos pires de porcelana, 
dragão partido, flor branca, 
ficou um pouco 
de ruga na vossa testa, 
retrato. 
Se de tudo fica um pouco, 
mas por que não ficaria 
um pouco de mim? no trem 
que leva ao norte, no barco, 
nos anúncios de jornal, 
um pouco de mim em Londres, 
em pouco de mim algures? 
no consoante? 
no poço 
Um pouco fica oscilando 
na embocadura dos rios 
e os peixes não o evitam, 
um pouco: não está nos livros. 
De tudo fica um pouco. 
Não muito: de uma torneira 
pinga esta gota absurda, 
meio sal e meio álcool, 
salta esta perna de rã, 
este vidro de relógio 
partido em mil esperanças, 
este pescoço de cisne, 
este segredo infantil... 
De tudo fica um pouco: 
de mim; de ti; de Abelardo. 
Cabelo na minha manga, 
de tudo ficou um pouco; 
do vento nas orelhas minhas, 
simplório arroto, gemido 
de víscera inconformada, 
e minúsculos artefatos: 
campânula, alvéolo, cápsula 
de revólver...de aspirina. 
De tudo ficou um pouco. 
E de tudo fica um pouco. 
Oh abre os vidros de loção 
e abafa 
o insuportável mau cheiro da memória. 
Mas tudo, terrível, fica um pouco. 
e sob as ondas ritmadas 
e sob as nuvens e os ventos 
e sob as pontes e sob os túneis 
e sob as labaredas e sob o sarcasmo 
e sob a gosma e sob o vômito 
e sob o soluço do cárcere, o esquecido 
e sob os espetáculos e sob a morte de escarlate 
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros 
e sob os gonzos da família e da classe, 
fica sempre um pouco de tudo. 
Às vezes um botão. Às vezes um rato. 
domingo, março 28, 2004
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